Estava
bêbado. Negava, mas estava. Também negava estar sofrendo, mas sofria.
A
janela convidava.
Ele
lembrou quando conheceu a mulher, no balcão da loja. Quando retornou no dia
seguinte, e nos demais, só para vê-la. Lembrou a cara que ela fez, quando
recebeu as flores que ele comprou. A primeira vez que se deram as mãos, depois
do expediente, quando ele a levou em casa, e o primeiro beijo, uma semana
depois. Lembrou-se dela na cama, naquela mesma cama onde ele estava sentado,
bêbado (isso ele negava). Lembrou-se dela avisando antes: É minha primeira vez.
Lembrou-se da vontade de dizer que era a primeira vez dele, também, só para
agradá-la. E da felicidade que acompanhava o amor. Lembrou-se das horas
contadas no trabalho, e de como saía às pressas para ir ao encontro daquela que
amava. Lembrou-se do dia em que ela lhe apresentara os pais. Lembrou-se dos
planos para o futuro, lembrou-se do pedido e lembrou-se da resposta. Lembrou-se
do padre, e do coração que não cabia mais no peito, de tanto amor. Lembrou-se
das juras: para sempre? Para sempre. Para todo o sempre.
Então
se lembrou da nuvem negra que veio se acomodar sobre a vida dele. Lembrou-se da
figura estranha que ela disse que a acompanhara na rua, e que passara a
enxergar por toda parte. Lembrou-se do cheiro de enxofre enquanto ele
trabalhava no encanamento da casa, e do que vira ao entrar no quarto.
Então
não quis mais lembrar.
Admitiu
que estava bêbado. Estava, sim.
Olhou
para a janela, que convidava para ver o amanhecer de perto. Depois de refletir,
à maneira dos bêbados, engoliu os últimos cinco goles do que tinha dentro da
garrafa. E aceitou o convite.
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