sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Júnior e o lagarto


           Seu animal de estimação era um lagarto grande, cinza, do tamanho de um cachorro de pequeno porte. Maior, se contasse a cauda comprida. Júnior dizia que era o seu pequeno dinossauro.

            O rapaz montava armadilhas ao redor da casa para capturar vivos os ratos e os outros animais que apareciam. Gostava de coloca-los na mesma caixa com o lagarto e ficar assistindo. Enquanto o intruso caminhava desconfiado pelo lugar estranho, o lagarto esticava a língua bífida, farejando através dela a novidade. Então avançava. A vítima era abocanhada e sacudida violentamente de um lado para o outro. Caso conseguisse se desvencilhar e fugir, o lagarto a capturava novamente e repetia o processo. O embate não durava mais de cinco minutos, e sempre terminava com o lagarto alimentado e satisfeito. Era um bom predador. Fascinado, Júnior chegava a elogiar o amigo: “Bom garoto”. 

Num domingo de manhã, Júnior encontrou o lagarto morto. Metade do corpo havia sido devorada, as vísceras ainda quentes expostas no chão da sala.

Júnior recolheu o corpo delicadamente. Levou-o para o quarto e deitou-se com ele na cama, em prantos. Ficaram assim até anoitecer, na escuridão da despedida, quando o silêncio foi interrompido por um crescente rumor. Júnior levantou a cabeça, desconfiado. Concentrou-se no ruído e, quando enfim identificou-lhe a origem, se viu tomado pelo horror.

Vindo de todos os lados, no chão, era possível ouvir nitidamente o som de um milhão de ratos que se amontoavam por cada canto da casa, subindo pelos móveis e devorando o que encontrassem pela frente. Quando sentiu que começavam a subir pelos pés da cama, tudo o que Júnior conseguiu fazer foi abraçar o lagarto morto e, incapaz de pôr para fora o pânico que o estrangulava, gemer.
 


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